Saindo do óbvio, faço a trend de ter me encontrado com meu eu do passado para tomar um café aqui. Bem mais honesta comigo. Eu, Sheila, psicóloga, no meio dos 36 anos, me encontrei com a Pricilla de 15 anos para tomar um café. Eu pedi um café sem açúcar, ela pediu uma Coca. Ela me perguntou se agora a gente gostava de café, ainda mais sem açúcar e eu sorri dizendo que sim, com um toque de canela, e ainda contei que agora, refrigerante é algo que quase não consumo mais. Ela me perguntou o que eu fazia da vida, e contei que sou psicóloga clínica, que percorri longos caminhos até chegar aqui, que antes disso fiz outra faculdade, a de Direito, mas que ainda faltava algo para os meus olhos brilharem ao trabalhar, e que finalmente eu tinha encontrado. Ela ficou receosa, já que se lembrou das experiências que teve com terapias prévias, mas contei para ela que ela teve ótimas terapeutas depois e que isso mudou a vida dela, e que após o curso, o meu posicionamento sempre foi ser o completo oposto das posturas que a feriu no passado. Ela me perguntou se eu conseguia me achar bonita, capaz, suficiente. Aí eu marejei os olhos porque me lembrei o quanto ela ainda sofreria sobre isso. Contei que foi um processo, que precisei entender quem eu sou, como sou, aceitar minhas potencialidades e meus pontos de melhoria, e só aí consegui ter autoestima e viver bem comigo mesma. Mas não pude deixar de acrescentar que tem dias que ainda duvido de mim mesma, que as velhas falas mentais surgem mas que consigo manejar, porque agora tenho ferramentas para me regular. Ela me perguntou se eu encontrei o amor e ao contrário do que eu esperava, não foi o choro que surgiu, e sim um largo sorriso. Eu encontrei o amor, em tantos lugares diferentes, mas ela não entenderia ainda! O amor que ela queria saber era o amor romântico, e sim, também encontrei ele, mas eu encontrei o amor próprio, o amor pela vida, o amor pelas pessoas, o amor pela profissão, o amor pelos bichinhos, pela natureza, pelo cantar dos passarinhos, por pegar a rodovia cantando no volume máximo, por deitar com meus pais na cama deles, por ter porto seguro na minha irmã, por ter a melhor amiga como alma gêmea, por voltar a fazer crochê, e em tantas outras situações. A resposta se limitou a "sim, encontrei, quase todos os dias da minha vida". Por fim, ela me perguntou se eu era feliz. Ah Pricilla! Te contei que sim, muito! Não o tempo todo mas muito. E mesmo sabendo que isso parecia algo inalcançável para ela, que não imaginava que eu chegaria tão longe, foi um acalento. Terminei o café e falei "querida, sei que a desesperança vai bater a porta, que você vai pensar em desistir várias vezes, que vai achar que não tem mais solução e que não vale a pena insistir, mas vai por mim, tem vida demais para ser vivida, e mesmo estando aqui, 21 anos na sua frente, falo com tranquilidade que ainda tem vida demais para ser vivida". Nos despedimos, e há um bom tempo eu não sentia tanta esperança de vida.