sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

7 - Teor Alcóolico

Meu banho foi mais longo que o previsto, fiquei encarando a água cair, tentando absorver os últimos acontecimentos, mas não consegui colocar em ordem a sequência de coisas que estava vivendo. Eu ainda sentia raiva da Virgínia, mas o fato da morte da Dona Cecília me fazia pensar que nada do que eu sentisse seria de muita importância, aí peguei meu telefone e disquei os números que sempre soube de cor.
- Oi Antônio. A voz dela mudou bastante de tom desde que saiu daqui, parecia estar preocupada com algo.
- Por favor, não me interrompa, o que eu preciso falar, preciso que seja agora antes que a coragem acabe.
- Antônio, eu não posso falar agora, te retorno em questão de minutos, pode ser?
- Não! Deixa eu falar!
- Eu preciso mesmo desligar. Me desculpa.
- Ok. Suspirei. - Ok.


Saí do apartamento rumo ao mercado que tinha na esquina, meu estoque de álcool estava de mal a pior e eu previa a necessidade de ficar completamente bêbado. Fui com o telefone na mão, coisa que quem me conhece tá cansado de saber que eu sempre me recusei a fazer, desbloqueava a tela, conferia o sinal, mas ele não tocava. Voltei pra casa e ela ainda não tinha me retornado. Eu não sabia o que fazer, ligar novamente pareceria desesperado, e apesar de eu estar bastante ansioso, decidi esperar mais um pouco.
Abri uma vodka, coloquei suco, gelo e dei uma boa golada. Porque afinal eu deixava ela tomar as rédeas da situação toda vez? Ela tinha um controle sobre mim que eu simplesmente não dominava. Então não, eu ia fazer diferente, eu ia até a casa dela, não teria como ela adiar mais nada. Catei o celular, virei o resto do copo e saí decidido.



Com mais espanto que eu esperava, a empregada da casa abriu os portões pra mim, disse que a Virgínia estava acompanhada mas que provavelmente não se importaria com a minha presença. Ok, era a primeira vez que eu voltava lá sem a incrível recepção da Dona Cecília, mas achei toda essa introdução meio estranha. Quando entrei pela casa, sem nem pensar, passei direto para o quarto dela, um caminho velho conhecido mas que pela primeira vez me fez estremecer por saber que ao fim dele, eu cumpriria a promessa de me declarar.
- Ei encrenca! Eu fui entrando e falando, sem me lembrar que ela estava acompanhada.
Dei dois passos pra dentro do quarto e congelei. O Sandro estava lá, tinha alguns balões de coração e pétalas pelo chão e sobre a cama. Não acredito no que estava acontecendo, eu tinha que estar interpretando errado. Não. Era verdade.
- Ei Antônio.
O peso da voz dela me jogou mais pra baixo ainda, quando os meus olhos confusos encontraram os dela, eu vi que ela sabia que tinha feito algo errado.
- Eu estou atrapalhando?
O Sandro riu, com um sorriso largo e presunçoso, como se ele tivesse cem por cento realizado.
- Não cara, até legal você chegar agora, afinal, vocês dois são bem amigos né? Olha. Ele esticou a mão esquerda da Virgínia pro meu lado.
- Olha só einh?! Que legal por vocês, fico feliz mesmo, eu nem tenho palavras nesse momento pra parabenizar vocês dois.
Eu olhei mais uma vez pra ela, agora procurando algum tipo de resposta que ela poderia tentar me dar. Mas ela abaixou o olhar e deu um sorriso que eu ainda estou tentando entender se foi de tristeza ou por estar sem graça da forma que eu cheguei lá.
- Casal, meus parabéns novamente, mas só passei aqui pra ver se tava tudo ok e já preciso ir. Felicidades.


Voltemos para a vodka. Talvez hoje eu não tenho absolutamente mais nada pra falar além disso.

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