sexta-feira, 25 de maio de 2012

'o inferno é não poder amar'

Vê se para de chegar no meu escritório com esses olhos marejados. Porque você me compra quando abre a porta. E me doa aos pobres quando vai embora. Entra aqui, diz que precisa de colo e se joga no sofá. Eu já te disse, esse sofá tem que estar em perfeito estado para quando meus clientes chegarem. Você nunca me ouve. Aí vou tentar te tirar de lá, e você pede pra eu mexer no seu cabelo. Você nunca vai crescer. Eu te adulo, te amanso. E aí você se joga em cima de mim. Puxa a gravata e amassa a camisa que demorei horas passando. Não que eu não te queira. Não. Eu quero. Mas pra variar, eu queria que fosse um pouco mais do meu jeito. Eu te levando pra jantar, depois pro meu apartamento, eu deixaria até você escolher a sua bebida vermelha. E lá a gente não ia ter que se importar com o sofá, os clientes, ou seu choro. Eu queria te cuidar, de verdade. Mas o único espaço que você me deixa entrar é o vão no meio das pernas. E eu, como bom e velho homem, entro. E depois, quando vou pra casa, queria poder te ligar. Nem seu telefone eu tenho. Você só passa ele praqueles babacas. Quando me liga, liga de qualquer orelhão na rua, desesperada, me pedindo qualquer coisa.  É que a noite eu fico carente, e você só sabe o que é carência no domingo a tarde, ou na segunda a tarde, ou qualquer dia que pedir atenção pra algum idiota e ele não der. Mal sabe você que não precisa deles, nem de mim. E assim vou deixando. Porque se descobrir o quanto é maravilhosa, meu sofá vai ficar impecável a semana inteira, e eu despedaçado sem você pra curar.

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